Radiografia da IA no Trabalho: o que o novo estudo da Microsoft realmente revela
A equipa da Microsoft analisou 200 000 conversas com o Copilot e desenhou um mapa pragmático de valor acrescentado por profissão, sem profecias de despedimentos em massa.
Quando comecei a ler o “Working with AI: Measuring the Occupational Implications of Generative AI”, da Microsoft Research (https://arxiv.org/abs/2507.07935), deparei-me com um trabalho diferente da habitual futurologia que tantas vezes polui a conversa sobre IA. A equipa da Microsoft olhou para a vida real: analisou 200 000 conversas anónimas com o Copilot, recolhidas nos EUA entre 1 de janeiro e 30 de setembro de 2024 . Em cada diálogo identificaram-se dois vetores, o “user goal” e a “AI action”, para perceber, respetivamente, o que o utilizador queria e o que o modelo efetivamente fez .
O resultado é um AI applicability score por profissão, construído a partir de três ingredientes: frequência da atividade, taxa de sucesso e amplitude do impacto. É, portanto, uma fotografia de onde a IA já acrescenta valor, não uma sentença sobre extinção de empregos.
A fotografia confirma a intuição: as pessoas recorrem sobretudo à IA para recolher informação, escrever e comunicar; em resposta, o Copilot age como conselheiro, professor ou compilador de dados . Esta cooperação não é simétrica: em 40 % das conversas, as atividades pedidas pelo utilizador não coincidem com as executadas pela IA, sinal de que o modelo complementa o trabalho humano em vez de o clonar.
Quando traduzimos essas interações para o mundo das profissões, surge um padrão claro. No topo do score estão intérpretes, historiadores, autores, representantes de vendas, equipas de suporte ou programadores CNC, ofícios onde a comunicação e o tratamento de informação são o pão-nosso de cada dia . No fundo da tabela encontram-se auxiliares de enfermagem, operadores de máquinas ou trabalhadores da construção; aqui, o Copilot não ergue paredes nem presta cuidados diretos.


Interessa notar que a ligação entre este score e o salário médio é ténue (correlação de 0,07) . A exigência académica pesa um pouco mais, as ocupações que pedem licenciatura apresentam valores ligeiramente superiores, mas a diferença não é abismal.
Retiro do estudo três mensagens: Primeiro, a IA generativa é hoje uma ferramenta madura para acelerar tarefas de conhecimento; quem domina escrita, síntese e argumentação em parceria com o Copilot ganha tração imediata. Segundo, o impacto económico dependerá menos da tecnologia e mais das escolhas de gestão: a mesma eficiência tanto pode libertar equipas para inovar como servir de pretexto para cortes. Terceiro, capacidade de apoiar não é capacidade de substituir, o próprio artigo alerta que extrapolar para cortes de postos de trabalho é precipitado, porque não mede decisões downstream .
Não faltaram carrosséis nas redes sociais a proclamar listas de “40 profissões condenadas” pela Microsoft. Ao ponto da mesma ter de vir esclarecer que o estudo não prevê despedimentos. Limita-se a medir onde a IA é útil hoje. A confusão é compreensível: números sem contexto são gasolina para títulos alarmistas, mas não devem distrair-nos da substância.
Para quem lidera equipas, a conclusão é simples: mapear os fluxos de trabalho internos, identificar onde há sobreposição com as atividades em que a IA já mostra alta taxa de sucesso e experimentar. Faze-lo cedo garante vantagem competitiva; fazê-lo sem estratégia gera apenas mais barulho. A tecnologia já se provou, cabe-nos decidir o que fazemos com ela.